Ações do Cruzeiro do Sul deixam o pregão da Bolsa e 'viram pó'
Folha de Sao Paulo
TONI SCIARRETTA
DE SÃO PAULO
14/09/2012 - 16h59
Atualizado às 17h20.
As ações do Cruzeiro do Sul deixaram, definitivamente, de ser negociadas na Bolsa de Valores após o Banco Central decretar nesta manhã a liquidação extrajudicial da instituição financeira, que estava sob intervenção.
Entenda a liquidação
Banco Central decreta liquidação do Cruzeiro do Sul
Bovespa suspende negociações com papéis do Cruzeiro do Sul
Ações do Cruzeiro do Sul disparam quase 25% com possibilidade de venda
No jargão do mercado, diz-se que os papéis "viraram pó", o que significa que perderam todo o seu valor investido.
A liquidação extrajudicial --fora da Justiça-- implica no fim das atividades operacionais da companhia, que deixa de existir, e não pode ser revertida. Daqui em diante, o liquidante será responsável por vender todos os ativos que tenham valor no banco com objetivo de recuperar dinheiro para pagar os credores.
Como sócios do Cruzeiro do Sul, os acionistas serão os últimos a receber qualquer dinheiro e apenas depois de se pagarem todos os demais credores, o que dificilmente costuma acontecer.
O último dia de negociação foi ontem, quando os papéis preferenciais (sem voto) terminaram a R$ 2,49, com alta de 24,5%. Na semana, essas ações tinha subido 44,8% com a aposta de parte do mercado de uma solução para manter o banco em operação. No ano, porém, esses papéis perderam 81,9% de seu valor.
LIQUIDAÇÃO
A liquidação foi decretada nesta sexta-feira depois do fracasso das negociações com o último interessado no Cruzeiro do Sul, o banco Santander.
Sem um comprador, o FGC (Fundo Garantidor de Créditos) recomendou a liquidação do banco, confirmada pelo Banco Central na manhã desta sexta-feira.
O Cruzeiro do Sul teve um rombo contábil de R$ 3,1 bilhões e está com patrimônio negativo. A instituição tem 0,25% dos ativos do sistema financeiro nacional e 0,35% dos depósitos.
Com a liquidação, os credores terão de reclamar os pagamentos na Justiça. O FGC garante a cobertura integral de depósitos até R$ 70 mil e mais os CDBs que foram comprados com garantia especial, conhecidos como DPGE.
Segundo o Banco Central, cerca de 35% dos depósitos do Cruzeiro do Sul contam com a garantia do FGC, que deve desembolsar R$ 1,9 bilhão para as coberturas.
NEGOCIAÇÕES
Desde a intervenção, cinco bancos se credenciaram para analisar os dados estratégicos do Cruzeiro do Sul, mas três desistiram na semana passada por achar o negócio arriscado.
Nesta semana, só o Bradesco ainda participava das negociações. O BTG Pactual, que era visto como um dos favoritos, também desistiu de fazer uma oferta. Na última hora, negociadores foram atrás do Santander, que aceitou discutir o assunto.
Um dos entraves era a dúvida quanto ao valor de benefício fiscal que poderia ser apurado no caso da compra. As estimativas iniciais eram de até R$ 1 bilhão em economia de impostos nos próximos anos. O problema é que esse benefício fiscal foi calculado com base em dados que são contestados.
O comprador teria ainda de trazer pelo menos R$ 700 milhões ao Cruzeiro do Sul.
O rombo financeiro é decorrente de mais de 300 mil empréstimos consignados fictícios, maquiagem de balanço, entre outros crimes.
O principal negócio do Cruzeiro do Sul é o crédito consignado, que não motiva mais os grandes bancos comprarem instituições menores porque eles próprios estão fazendo essas operações, com custos menores. Além do consignado, o banco tem uma corretora e uma gestora de fundos. Essas operações também foram afetadas pela liquidação.
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TIRE SUAS DÚVIDAS SOBRE A LIQUIDAÇÃO
O QUE ACONTECE COM FUNCIONÁRIOS DO BANCO?
- A maioria deverá será demitida porque a empresa deixou de operar. O liquidante, no entanto, pode reter alguns funcionários para manter o funcionamento de serviços internos, como processamento de contas
MUDA ALGO PARA QUEM FEZ EMPRÉSTIMO CONSIGNADO?
- A cobrança das parcelas não é suspensa; o cliente tem de manter os pagamentos em dia, sob risco de ficar inadimplente junto aos liquidantes
QUEM TEM DEPÓSITO NO BANCO CONSEGUIRÁ REAVER O DINHEIRO?
- O FGC (Fundo Garantidor de Créditos) garante a devolução de até R$ 70 mil por CPF e por banco. Se a conta for conjunta, cada CPF tem direito a R$ 70 mil. Se o depositante tiver conta no Cruzeiro do Sul e também no Prosper, tem direito a receber R$ 70 mil de cada um porque a fusão dos bancos não foi aprovada pelo BC
E QUEM TEM CDB?
- Esses clientes têm os mesmos direitos dos depositantes de receber até R$ 70 mil, com exceção daqueles que compraram títulos com garantia especial (DPGE); nesse caso, a garantia é de até R$ 20 milhões
COMO RECEBER OS R$ 70 MIL DO FGC?
-O fundo divulgará um canal eletrônico para quem tiver direito à indenização enviar seu pedido com a cópia de documentos básicos. Se tudo estiver certo, o FGC deposita o valor em até três dias
HÁ GARANTIAS PARA QUEM TEM FUNDO DE INVESTIMENTO?
- Os fundos não têm a garantia de R$ 70 mil, mas têm ativos (ações, títulos etc.) com garantias reais que preservam seu valor. A gestão e administração podem ser passadas a outra instituição
AS AÇÕES DO BANCO MANTÊM SEU VALOR?
- Não, os papéis do banco perderam todo o seu valor e viraram "pó", segundo o jargão do mercado. Como sócios do banco, os acionistas se tornam os últimos da fila a receber qualquer dinheiro depois de serem pagos todos os demais credores
O QUE ACONTECE APÓS A LIQUIDAÇÃO?
- O liquidante faz um inventário de todos os ativos, avalia os valores correntes que podem ser recuperados e inicia um plano para pagar os credores
QUEM RECEBE PRIMEIRO?
- Os créditos trabalhistas (salários, indenizações etc) têm prioridade. Depois, vêm os créditos com garantia real (automóveis e prédios alienados etc.) e os tributários. A terceira classe de credor é a com cláusulas especiais nos contratos, que ficam à frente daqueles sem essas ressalvas. Finalmente, recebem os sócios e acionistas
QUANTO TEMPO DURA A LIQUIDAÇÃO?
- Há vários trâmites e prazos regulamentares para ouvir as demandas de credores, o que pode levar o processo de liquidação a mais de dez anos